"Odeio cantadas. Flores não me seduzem. Chocolates então, nem pensar. O que me comove são palavras.
No
caminho de casa, passo por uma pista de cooper onde têm barras e
aparelhos de ginástica. Em qualquer hora do dia ou da noite, rapazes de
se fazer inveja aos galãs globais puxam ferros, correm mais do que para
tirar a mãe da forca, levantam pesos, malham até o dedão do pé. Ao lado
deles, garotas soltam suspiros para cada flexão de braço, lançam
exclamações para cada bíceps trabalhado, fazem votação para definir qual
peitoral é o mais sarado. Deixo tudo para elas. Tais rapazes não
merecem um segundo olhar meu. Para mim, músculo em excesso é
inversamente proporcional à inteligência.
Fim
de semana. Depois de muita insistência, aceito o convite das minhas
amigas para ir dançar, mesmo sabendo que me arrependerei. Lugar dos
infernos. Quente, barulhento, enfumaçado. E ainda por cima tenho que
escutar aquela mesma frase: "E aí, gata, vem sempre por aqui?". Fico na
dúvida entre vomitar, sair correndo ou fingir que sou surda.
Outra
situação: O moço é lindo. Toca violão. Minha família gosta dele. Já
estou quase convencida de que é minha alma-gêmea. E então ele me manda
um cartão: "Não me canço de te olhar". É, querido, vai ter que olhar para o outro lado. Cansada estou eu de quem não sabe escrever nem em português.
Mas
por que eu sou tão viciada em palavras? Por ter crescido lendo enquanto
minhas amigas brincavam de pique-esconde? Por minha primeira paixão ter
sido o Cebolinha, nos gibis da Turma da Mônica? Por amar poesia desde
que nasci? Não sei. O fato é que me desperta curiosidade quem sabe
escrever o que pensa.
Garotos
que escrevem bem têm um charme diferente. Suas palavras me acariciam de
tal forma, que se tornam vitais para minha sobrevivência. Se eles têm
tanto cuidado com a escrita, imagine o carinho que teriam comigo... Ah,
os homens que sabem escrever! Alguns conseguem ser tão sinestésicos, que
chego a perceber a voz deles por entre as linhas.
Os
que mais me impressionam são os que adivinham meu pensamento, mesmo sem
me conhecer. É indescritível a sensação de ler um texto e me
identificar totalmente com as palavras do escritor. É como se ele
tivesse roubado a ideia que eu ainda não havia tido, mas que já existia
em mim. Emocionante perceber, na medida em que meus olhos vão descendo
por sobre o texto, que existe alguém que pensa exatamente como eu.
Infelizmente,
a recíproca não é verdadeira. O sexo masculino, no geral, ainda se
sensibiliza mais com um corpo esculpido do que com a forma que as
escritoras dão às suas frases.
No
dia em que eu encontrar um que se importe mais com o que eu escrevo do
que com a minha embalagem, eu me caso. Desde que a proposta seja feita
por escrito. E que por trás daquelas palavras, existam óculos em vez de
músculos."
Crônica "Apaixonada por palavras"
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